por Luís Reis Ribeiro, Publicado em 20 de Abril de 2010
É certo que os países tem problemas crónicos, mas a Comissão Europeia também acusa os grandes bancos de investimento e hedge funds de agravarem as condições de financiamento
Portugal e Grécia têm culpas directas na derrocada da confiança dos investidores nas respectivas dívidas nacionais, mas os grandes bancos de investimento mundiais e os fundos de alto risco (hedge funds), que especulam sobre o valor da dívida pública dos países e lucram com isso, também não saem bem na fotografia. Segundo a Comissão Europeia, estas empresas estão a contribuir para o descarrilamento das taxas de juro, agravando a situação financeira já de si debilitada dos governos e respectivas economias.
Fonte oficial do comissário europeu dos Serviços Financeiros, Michel Barnier, explicou ao i que "não nos cabe a nós dizer quais as instituições envolvidas [de forma activa, nos negócios com a dívida pública e com derivados para cobertura do risco]", mas aponta o dedo aos "grandes bancos de investimento e hedge funds" que estão a alimentar a instabilidade dos mercados.
Segundo a sua porta-voz, Michel Barnier "acredita fortemente que precisamos de pôr um ponto final a anos de escuridão, opacidade e comportamento secreto" na área dos derivados.
Um dos maiores bancos do mundo, o Citigroup, anunciou ontem lucros de 3,7 mil milhões de euros no primeiro trimestre, o melhor resultado desde o início da crise financeira - o ressurgimento do mercado das obrigações foi um dos factores-chave nos bons resultados do banco.
Ontem, o secretário de Estado do Orçamento, Emanuel Santos, observou à TSF que "o apetite dos mercados não desaparece e há sempre tentações para atingir outros países". Para o governante, "o objectivo dos mercados é o lucro" e "portanto, se a Grécia não lhes chega, eles preparam-se para tentar colar à Grécia situações que não são iguais para tirarem partido dos spreads mais elevados", disse, referindo-se implicitamente a Portugal.
Os produtos financeiros problemáticos servem para cobrir os supostos riscos associados a outros activos - por exemplo, os CDS (Credit Default Swap) são muito usados para cobrir o risco das dívidas públicas, sobretudo as dos países mais fragilizados com a crise financeira e económica, como Grécia e Portugal. Estes seguros (CDS) cobrem o risco de incumprimento ou mesmo de falência das nações. O problema (para os contribuintes) é que, em muitos casos, quanto maior o risco e quanto pior estiver o país, mais ganham os investidores. Portanto, existem incentivos crescentes em fazer descarrilar os Estados. Portugal e Grécia acabam por ser os elos mais fracos da zona euro.
"Há neste momento duas verdades, duas metades do problema. A primeira: nós temos culpa porque nos pusemos a jeito com a evolução da situação económica nos últimos anos. Mas há outra: os inimigos do euro andam aí e há muitas pessoas que estão interessadas no fim da moeda única", constata Filipe Garcia, economista da consultora IMF.
Como e quando vai actuar a Comissão? O processo será complexo: "Temos de ver como é que os CDS estão a ser usados", refere a porta-voz de Barnier. Depois, "em Junho, faremos a nossa proposta sobre os derivados [CDS]", mas só em Outubro avançaremos com uma proposta autónoma que olhará especificamente para as vendas a descoberto [short selling] e outros aspectos em torno dos CDS".
A posição europeia terá de ser calibrada com os interesses da própria indústria e, sobretudo, com a vontade política do Reino Unido que, em Abril, provocou o adiamento dos avanços na regulação sobre os hedge funds. E terá de ser discutida com os restantes países mais ricos, nas próximas reuniões do G20. Uma acontecerá em Junho, no Canadá, outra em Novembro, Coreia do Sul.
Portugal e Grécia voltaram ontem a sentir grande hostilidade dos mercados, com os respectivos spreads [risco dos países] a disparar (ver texto ao lado) e a dificultar o financiamento da actividade interna. Há investidores, economistas e comentadores internacionais que acusam os países de terem cavado a sua própria sepultura nos últimos anos. Viveram a crédito e evoluíram pouco em termos económicos. Agora, que chegou a hora de pagar a factura, muitos levantam dúvidas sobre o músculo financeiro dessas nações e sobre a capacidade de irem ao mercado pedir emprestado.
A Grécia está bastante mal (os juros que estão a pedir ao país são exorbitantes), tendo Atenas aberto já a porta a uma possível utilização do pacto salvamento providenciado pela União Europeia e FMI. Segundo muitos especialistas, a Grécia está à beira da falência e Portugal já esteve mais longe.
A última investida foi de Simon Johnson. O antigo economista-chefe do FMI e colunista do "The New York Times", diz que Portugal vai ser "o próximo problema global". O ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, ripostou: "São comentários reveladores de ignorância e que ilustram o preconceito céptico em relação ao euro". Em entrevista do "Jornal de Negócios", Johnson voltou à carga, acusando o governo de estar "em negação".
Retirado de ionline.pt
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